O velho vinil de sete polegadas girava na velha vitrola empoeirada. Colocou a agulha no sulco e o som antigo preencheu o quarto. Era como uma viagem no tempo. Aquele quarto moderno, com as paredes brancas e os móveis geométricos, escurecia com a música, tornando-se mais amarelado. Os móveis ganhavam contornos imperfeitos e a fragrância do sachê comprado na butique recebia um aroma de madeira com fundo de eucalipto.
A canção terminava numa sílaba vocalizada de maneira estridente e o pequeno disco, continuando a rodar, emitia ruídos. O impulso de virar o vinil foi controlado pela vontade de ouvir aquilo outra vez. Colocou a agulha no lugar certo e ouviu tudo de novo. Terminou e, mais uma vez, a agulha tocou o começo da música. Fez isso continuamente, talvez por horas. O volume, agora mais mais alto, invadiu os demais cômodos da casa, incomodando aqueles que não suportavam mais ouvir a mesma velha canção.
- Vira esse disco, não sabe ouvir outra coisa, não? - berrou uma voz mal humorada vinda da sala.
Naquela casa grande, decorada de maneira sóbria, como os pais gostavam de se gabar com os amigos igualmente pedantes que os visitavam, era tudo frio, fosse inverno ou verão. Sentia falta de simplicidade, da casa dos avós, da calorosa recepção dos primos sempre que os via. Sentia falta de um aconchego, do calor humano, e aquela voz trazia tudo isso de volta. Queria poder abrir a janela e receber a luz do sol no rosto pela manhã, porém, enquanto lá vivesse, isso não seria mais possível.
Conformada com o aviso, abaixou o volume vitrola, mas não virou o disco. O barulho da televisão na sala invadiu seu espaço, mas fingiu não se importar. Colou o ouvido direito na caixa de som e, tão logo a música terminou, levou a agulha para o ponto inicial.
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