Ella canta e me embala, enquanto fantasio e danço sozinha pela sala. Os olhos fechados, a sensação de estar nas nuvens. Os mais bem guardados segredos escapando sutilmente de dentro da caixa. "Anything goes". O grito de "corta!" me paralisa, enquanto o diretor se aproxima e aconselha esboçar um leve sorriso enquanto me movimento e rodopio, mexendo levemente a cabeça, com os lábios entreabertos, repetindo um ou outro verso.
Uma vertigem estranha atravessa-me repentinamente, tal qual uma flechada. O brilho nos olhos se torna mais visível, ao mesmo tempo que o corpo pesa e cambaleia na direção da poltrona. "It's too darn hot", e o ventilador sopra timidamente no recinto. Como uma diva provocante, levanto-me e jogo a cabeça para trás, levantando-a bruscamente para que o cabelo encubra minha face ruborizada. Os versos já não saem mais de meus lábios. No lugar deles, sussurros esboçam melodias graves.
Ella canta e me encanta, enquanto "I get a kick out of you" e rio da situação, sem parecer me importar com o futuro e a verdade por trás de tudo. É o momento e a fantasia do encontro que me movem a manter a coreografia. Delicadamente, sigo em frente. Paro e jogo meu quadril para o lado, como num falso jogo de sedução visto em um filme qualquer. "Do I love you?" Jamais saberei ao certo, mas enquanto a música tocar, encarno a personagem. Afinal, "What is this thing called love?"
As melodias sopram no ambiente, tal qual o vento quando assovia em uma noite de inverno enquanto agarro o edredom e o abraço imaginando seu corpo me aquecendo. Mas o frio está a milhas de distância de mim. "Let's do it (let's fall in love)", insinuo, enquanto imagino você me encarar sedutoramente. A malícia encarna em mim e caminho em sua direção, desabotoando o primeiro botão da blusa.
No seu colo, insinuo-me e murmuro "Let's misbehave", fugindo do roteiro e fazendo de Cole Porter o intérprete de meus sentimentos. O fade out corta a cena e apenas nós dois saberemos o que se passou depois disso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário