terça-feira, 25 de novembro de 2008

Lolita não está mais à venda

A pré-adolescente com a boca vermelha de batom sorriu e mordeu os lábios de forma provocante. Humbert fingiu não notar, mas o prazer queimava dentro de seu peito. Olhava para ela de esguelha e continuava conversando com a mãe da garota como se não tivesse percebido nada. De repente, Lolita olhou para mim como se estivesse suplicando. No mesmo instante, Humbert e Charlotte interromperam a conversa, perceberam o que estava acontecendo e me lançaram o mesmo olhar. Nabokov surgiu ecoando em minha mente. “Lo-li-ta: a ponta da língua descendo em três saltos pelo céu da boca para tropeçar de leve, no terceiro, contra os dentes. Lo. Li. Ta”. O escritor russo não estava disposto a me perdoar caso eu desse prosseguimento àquilo.

Enquanto aguardava a mulher retornar, o livro de capa azul encardida repousava silenciosamente naquele móvel. As outras obras sobre o balcão do sebo eram ignoradas, e a de capa verde do Saramago devia estar enfurecida por parar ali sem sentir metade de suas páginas serem tocadas por meus dedos de leitora, vorazes enquanto as histórias conservassem minha afeição.

A mulher regressou e tentou encontrar algum valor nos objetos que simbolizavam o sustento de sua loja. De sobressalto, apanhei Lolita e coloquei de volta na sacola, relembrando algumas passagens do livro, o período da faculdade quando o li e o ótimo professor que lecionou a matéria que me apresentou a obras tão marcantes. “Mudei de idéia, esse aqui não quero mais vender”, respondi à vendedora/compradora.

Imaginei Lolita saltitante, agindo de forma mais semelhante a uma criança do que a um símbolo sexual. Pensei em como teria sido difícil a um russo escrever uma história daquelas em inglês, criticando a sociedade consumista norte-americana da década de 1950 e tratar do tema pedofilia em um período de puritanismo e conservadorismo nas artes. Fantasiei Stanley Kubrick dirigindo Peter Sellers na adaptação cinematográfica de 1962. Todas essas imagens me acompanharam até o caminho de volta. E a língua tocava o céu da boca e os dentes conforme o nome da personagem.

6 comentários:

Rodrigo Carreiro disse...

Nunca li esse livro =/
it´s a shame

Marguerita disse...

Também nunca li.
:/

Sunflower disse...

Li esse livro uma vez pra nunca mais.

Não é que ele não seja bom, é o contrário. Tão bom que me prendeu e me angustiou e me deixou com medo de ver o filme.

beijas.

PS: A parte da pronúncia do nome é a minha favorita.

Alexandre disse...

Eu só vi o filme. E não o do Kubrick (o qual pretendo ver), mas o último.

No mais, notei que a senhorita vai participar da platéia do CQC. Estava justamente conversando com meu irmão ontem pra mandar um e-mail pra eles e entrar na fila.

Só quero ver a tietagem com o Marco Luque. rs

Cristina disse...

Já tive esse livro à minha disposição, mas não quis ler, sei lá porquê. Mas ainda pretendo fazê-lo. E ver o filme do Kubrick - já na lista do netmovies.

Tania Capel disse...

meu LOLITA está an cabeceira e não consegui comecar a ler... aguardando as férias! hunf...
beijos