segunda-feira, 13 de julho de 2009

Melancolia infanto-juvenil

Na minha infância, tinha uma coleção de livros de contos de fadas que adorava ler, mesmo sem saber como fazer isso, pois me divertia com as belas ilustrações feitas com bonecos e cenários que eu sonhava em estar. Para saber o que realmente acontecia nas histórias, esperava pela boa-vontade de alguém alfabetizado e paciente, pois eu tinha a mania de interromper para dar mais uma olhada nas imagens e fazer a comparação com o que havia sido narrado.
Imaginava como deveria ser saborosa a casa de doces que João e Maria encontravam após serem abandonados pela madrasta malvada na floresta. E o sapato de cristal da Cinderela, como ele não se quebrava? Feijões mágicos eram feijões coloridos ou balas que tinham gosto de feijão?
Mas essas dúvidas nunca superaram o desejo de mudar o final de um desses contos. Embora todos sempre tivessem um final feliz (Joãozinho derrota o Gigante e fica milionário; Branca de Neve é despertada do coma com um beijo apaixonado; Polegarzinha encontra vários seres da sua espécie...), havia um que terminava de maneira triste e trágica: A pequena vendedora de fósforos. Para quem nunca leu, informo que se digitar o título no Google aparecerão inúmeros resultados de sites que transcreveram a clássica história do dinamarquês Hans Christian Andersen.
Enquanto estava em minha casa, cercada de brinquedos e jogos, com uma mãe sempre preocupada com o horário do lanche da tarde, aquela garota estava à deriva e sozinha em uma grande cidade, amedrontrada pela fome, pelo frio e pela solidão. E pior: numa noite de ano novo.
Talvez esse conto tenha sido a minha primeira percepção de que o mundo estava além das paredes de casa, do portão da escola, do banco do carro. Enquanto a pequena vendedora de fósforos sucumbia à morte e reencontrava a avó, eu tentava, em vão, abrir a porta de minha casa, entregar-lhe um cobertor e servir um copo de leite quente. Foi o fim da inocência, a descoberta de que nem sempre havia pessoas boas e acolhedoras ou um final feliz.

6 comentários:

Rodrigo disse...

A imaginação infantil é a coisa mais fabulosa de todas. Incrível!

Marguerita disse...

Compartilho da história!

Tem o filme também, já vistes?

Mudou minnha percepção do mundo e pequena ainda, chorei de tristeza. Uma tristeza pelo mundo e de coisas que não estão ao meu alcance.


Até hoje, quando vejo uma criança abandonada, vejo nela a vendedora de fósforo.

Belo post!

Bjs

Anônimo disse...

não li mas com certeza vou ler. essa percepção que o livro deu a você e à marguerita aí em cima eu tive 'no mundo real', visitando aldeias indígenas e morando na fronteira com uma das regiões mais pobres do paraguai. como eu tinha apenas 6 anos de idade, parece que não houve assim um momento exato de percepção mas eu sempre tive noção de que existia 'diferença' entre aquilo tudo e o meu mundo.

lindo post!

Alexandre disse...

As vezes eu penso que li poucos contos na infância e vi muito He-man.

Os únicos que me vem à cabeça são "João e o pé de feijão" e aquele do macaco e a velha, adorava esse. Não tinha um dia das minhas férias que não pedia pra minha avó ler, coitada. rs

O Macaco e a Velha: http://blog.deixaqueeuconto.com/blog2.php/2009/04/18/o-macaco-e-a-velha-1

Jaques, the fool disse...

nossa! esse conto é um dos meus preferidos!
no primeiro ano de faculdade tínhamos que escolher um conto de fadas e escrever nossa própria versão dele...escolhi esse aí...
mas acho q já tinha perdido minhas ilusões há tempos....pq mesmo tendo em mãos o poder de transformar o final, preferi fazer da pequena vendedora de fósforos uma viciada em heroína, que morria de overdose em um beco escuro na vépera do ano novo, sendo encontrada na manhã seguinte por um grupo de policiais totalmente indiferentes...

minha professora nao gostou.

Marguerita disse...

Tem sim! Dá uma procurada..não o desenho e sim, filme!

beijooo