sábado, 7 de setembro de 2013

A menina

Era uma festa infantil, mas não havia muitas crianças no salão. Algo pesava no peito de uma das convidadas, que resolveu se afastar de um grupo que conversava sobre um assunto qualquer, em busca de um lugar mais tranquilo onde pudesse se sentar e simplesmente terminar de beber o refrigerante do copo descartável transparente.
Encontrou um canto ignorado pelos outros convidados e pela própria música, que o alcançava com o volume mais baixo do que o resto do salão. Acomodou-se na cadeira e bebeu um longo gole do copo. Afastou a manga da blusa e conferiu as horas no relógio de pulso que acabara de comprar. Ajeitou-o e, quando levantou a cabeça, foi surpreendida por uma menina de olhar curioso a fitando. Sem saber o que dizer, simplesmente voltou a olhar para o relógio.

- Você tá triste? - indagou a menina com olhar curioso.
- Ãhn? É... Não... Por que tá perguntando isso?
- É que você tá aí sozinha e todo mundo tá lá. - apontou para o outro lado do salão, onde as pessoas conversavam e algumas até dançavam com as crianças.
- Não estou sozinha, você tá aqui também.
A menina a encarou mais uma vez, como se seu olhar questionasse a resposta.
- Eu só estou cansada.
- Mas a festa tá começando! Vai demorar um tempão pra cortar o bolo. Eu só fico cansada no final.
Achou graça no comentário e acrescentou:
- Sim, é mesmo. Quando eu tinha a sua idade só me cansava no final também. Voltava pra casa dormindo no carro.

Ao dizer isso, reparou melhor na menina: corpo magro, pernas finas, cabelos e olhos escuros. A franja balançava de um lado para o outro, conforme ela se expressava e gesticulava as mãos ao falar. Lembrava-lhe alguém, inclusive a voz e o modo como falava. 
- Mas o que aconteceu? Você não gosta mais de festas? 
- Eu gosto, é que... sim, estou triste. Você acertou.
A menina balançou a cabeça afirmativamente, como se dissesse "eu sabia". 
- Não pensei que fosse assim tão chato ser adulta
- Como é que é? - olhou incrédula para a menina, impressionada com a semelhança física entre as duas. Até o jeito de balançar a cabeça e morder o lábio inferior era idêntico.
- É... chato. Eu sempre tenho hora pra fazer tudo. Nunca posso ficar mais tempo na festa nem ver filme à noite na TV. Preciso comer legumes e feijão, senão não ganho sorvete. Mas pelo menos não fico triste em festa de aniversário.

Ela abriu a boca para responder à menina, que repentinamente se afastou. Procurou-a pelo salão, mas não a encontrou. Aproximou-se da mãe do pequeno aniversariante e a descreveu, mas não obteve resposta sobre quem seria nem onde poderia estar. Passou o resto da noite pensando naquele diálogo inusitado.
Ao voltar para casa, colocou a cabeça sobre o travesseiro e encarou o teto durante longos três minutos. Suspirou e lembrou-se dos bons tempos em que ouvir um "boa noite" indicava que teria um sono tranquilo e sem pesadelos.

Nenhum comentário: