Ela vestia veludo azul. Um longo vestido e sandálias de salto alto pretas. As unhas das mãos e dos pés eram pintadas de vermelho, contrastando com o tom noturno da roupa e combinando com o batom. Seus cabelos escuros e anelados mal alcançavam a altura dos ombros, e brilhavam sob a luz neon do palco sujo.
Cantava como uma amante mimada que tenta persuadir seu homem a abandonar a esposa e fugir com ela, para viverem eternamente felizes e sem preocupações. Não encarava o público: fixava seu olhar na parede oposta ao palco, mas vez ou outra eu conseguia notá-la me fitando.
A apresentação terminou e fui o único a aplaudi-la. Não que ela fosse uma ótima intérprete. Não que eu tivesse gostado. Não que eu a desejasse. Foi apenas uma atitude educada de um espectador curioso e solitário, que encontrou naquele lugar um refúgio pacífico para seus desalentos.
A mulher agradeceu timidamente, sem olhar em minha direção. Desapareceu do palco e ressurgiu sentada em um banco alto, bebendo algum drink. O glamour do figurino e da maquiagem não estava mais presente. Agora, ela era uma pessoa comum, concentrada em seu vício e entediada em sua rotina. Ensaiei uma aproximação, mas não tinha assunto. Observei-a se levantando para apanhar uma grande sacola, provavelmente com o vestido e todos os acessórios que intentaram transformá-la em uma diva decadente. Saiu e poucos perceberam sua ausência. Eu, porém, jamais esqueci o brilho ondulante daquela luz obsoleta em seus cabelos delicados.
5 comentários:
E eu lendo isso lembrei daquele clipe da Lily Allen interpretando Kaiser Chiefs. :)
Essa crônica tem inspiração em algum filme?
Cristina comentou sabiamente. Se ainda não é filme, pode virar um. Pelo menos a introdução.
(já imaginei filmes que começam assim)
picture perfect!
nossa, na seqüência ela deveria ser assassina e daí teríamos uma trama de filem noir...
legal a descrição das cores! fiquei viajando!
beijos
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