quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O intelectual e a aspirante a jornalista

A entrevista havia sido marcada pelo telefone: seria em uma terça-feira de setembro (não recordo a data), às 15h00. O endereço e uma explicação de como chegar ao local foram anotados com muita atenção. Eu estava ansiosa (e um tanto nervosa). Mas a voz calma do outro lado da linha indicava uma pessoa extremamente gentil.
No dia seguinte, comentei com alguns professores sobre o sucesso em conseguir aquela entrevista.
- Ele é uma flor de maracujá! Muito fofo! – afirmou a professora que conhecia o entrevistado há muitos anos.
- Chame-o de senhor, seja muito educada e aproveite o momento. Será muito importante para o seu TCC – aconselhou o orientador da tese, aparentemente mais nervoso do que eu.

Cheguei antes do horário marcado e fiquei aguardando ele chegar. Estava muito nervosa, afinal era o Antonio Candido. Um intelectual, professor, pesquisador, autor... de grande importância para a cultura brasileira; a figura chave para o meu trabalho, um perfil biográfico jornalístico do critico de cinema Paulo Emilio Salles Gomes, falecido em 1977. Juntos, eles e outros jovens como Ruy Coelho, Decio de Almeida Prado, Gilda de Mello e Souza (para citar alguns), fundaram a revista Clima, na década de 1940. A publicação foi um marco para a crítica cultural brasileira, influenciando autores e editores de grandes jornais a investirem nesse tipo de produto.
Em frente ao prédio, o porteiro avisou que Antonio Candido tinha saído e retornaria por volta das 16h00. Eu quase entrei em pânico, preocupada com o horário, com algum imprevisto que pudesse acontecer e, pior ainda, que ele tivesse esquecido daquele encontro.
Mas, enfim, eis que surgiu um senhor muito simpático. Eu me apresentei a ele, que indagou se a gente não havia marcado para o dia seguinte: ele anotou na agenda que seria na quarta-feira. Felizmente, me recebeu. Pediu desculpas pela confusão e subimos juntos para o apartamento dele, onde seria feita a entrevista. Assim que adentrei, fiquei maravilhada: a sala era uma biblioteca com centenas de livros. Fiquei imaginando ele, outrora, estudando aquilo tudo, fazendo esboços de pesquisas, preparando aulas...
Sentamo-nos em duas poltronas nessa sala. Preparei meu gravador e o bloco de anotações, dei uma relida nas questões e a entrevista começou. Depois de tudo, pensei bem e não foi, de fato, uma entrevista: foi uma conversa, de tão descontraída e enriquecedora. Houve um momento em que fomos interrompidos por uma ligação. Ele pediu licença, atendeu o telefone e voltou à entrevista exatamente no ponto onde havia parado – notei ao ouvir a fita novamente; nem parece que havia tido uma pausa de alguns minutos. Um senhor de 88 anos (hoje ele tem 90), tão lúcido e atencioso que me fez querer chegar à idade dele assim também.
Em certo momento, perguntou “qual é o seu nome mesmo?”. Respondi e ele falou que era muito bonito, lembrando que era parecido com o de sua mãe. De repente, começamos a falar sobre Minas Gerais, Estado onde ele cresceu e do qual a minha família provém. E, claro, não tem como falar de Minas sem mencionar a maravilhosa culinária mineira.
A entrevista gerou muitos comentários na faculdade, e até piadas. “Você não acha que ela deveria fazer uma camiseta escrito ‘Eu entrevistei o Antonio Candido?’", a professora comentou com meu orientador. Mesmo tímida com toda essa badalação, eu me senti orgulhosa. Há fatos na vida que a gente prefere apagar. Melhor, porque assim sobra mais espaço para aquilo que devemos registrar.

11 comentários:

Patrícia disse...

E foi assim que Lu matou sua amiga estudante de Letras (na época) de inveja! Hahahaha.

Rodrigo Carreiro disse...

Jornalista é ruim em muitos pontos, mas de vez em quando rola uma felicidade dessas. É bom ;p

Cristina disse...

Antonio Candido é Deus.
O dia em que encontrar esse senhor, vou me ajoelhar e beijar suas mãos. Verdade.

Sunflower disse...

Eu falei pelo telefone com a filha do joaquim pedrom de andreade.

O meu TCC (de comunicação sociao Publicidade e Propaganda) teve como tema A narrativa do herói mitólogico no cinema, fiz um estudo de casa, e eu, é claro, peguei o heró tupiniquim sem caráter, o Macunaíma.

Na época (2004) o filme era raríssimo de se achar, e eu tive que ligar pra ela pra ela me liberar uma cópia, ela me mandou zilhões de fax porque o ano seguinte ia ser o ano de ele cultural brasil-frança e ele sereia reexibido publicamente lá, e só lá. Eu queria só tirar fotos, vê, rever analisar, pois nada disso tinha na época na internet. Virei referência na faculdade, vinham pedir o filme emprestado, eu não dava, lógico.

Bom, foi excelente.
beijas

Sunflower disse...

gente, quantos erros acima... tenho que parar de fazer mil coisas ao mesmo tempo, ou ao menos reler antes de tacar o dedão no enter.

beijas

Alexandre disse...

Eu conheço muita pouca coisa dele, só lembro que lia muito textos que saiam no Mais! (FSP).

Aliás, fui me dar conta de quem era depois que você me contou essa mesma história.

Whatta shame.

:)

Jaques, the fool disse...

nuossa! q poder hein! ahsuahsuahsua

se eu tivesse a oportunidade de entrevistar esse senhor, provavelmente diria: olha aqui meu filho, vc simplesmente MATOU meus sonhos adolescentes ao dizer q alvares de azevedo estava descrevendo o ato da masturbação no poema "meu sonho" (meu favorito no colegial). VC FEZ PICADINHO DO MEU CORAÇÃO TEEN BEM ALI!!!

haushaushuashahsu q nada... XD

eu ficaria paralisada feito uma tonta e gaguejaria em todas as perguntas...hasuhaushua XD

Anônimo disse...

Sorte a sua ter cruzado com Antonio Candido.
Um dia, lá em São Paulo, cruzei com Dráuzio Varela..ui!!!

Lu. disse...

Caramba, Antonio Candido? Realmente, você tem o poder. Eu bem que vou precisar de uma ajudinha dele.

fabiana disse...

Nossa, que honra!

Tania Capel disse...

caracas... vc me lembrou que eu tomei café um dia com ele... muito simpático mesmo! e humilde! na época eu era uma mera estudantezinha de letras, mas... como era queridinha dos professores e ajudava na organização da semana de estudos literários, tive o prazer de passar algumas horas com ele! um deus!...